Do Face XXXIV

A VIDA TEM DESSAS COISAS

Esta senhora é dona Suzana Nobre da Silva, minha mãe. No auge da sua força física e capacidade mental, foi imbatível. Uma dona de casa de primeira. Costureira de mão cheia. Igrejeira e atuante. Por anos a fio foi ministra da Ordem Franciscana Secular, também ministra da Eucaristia e fazia parte da irmandade do Coração de Jesus. Mulher incansável. Ainda hoje quer fazer da fraqueza força e produzir. Mas já não dá. O tempo passou. E não foi tão piedoso para ela. Só lhe resta seguir a vida com o seu olhar distante. Dona Suzana, enquanto pôde, fez muito para tantos e tantos. Hoje ela é lembrada por poucos. Não foi uma senhora de engenho. (Eliel Silva – 09 de março de 2016)

Do face XXXIII

Foi num dia comum. Já haviam se passado todas aquelas datas comemorativas. E então eu resolvi fazer uma visita ao túmulo do meu pai. No cemitério, aquele império do silêncio onde todos se igualam, diante da sua sepultura, me pus a meditar. E uma paz me invadiu quando senti a sua presença ali. Meu velho pai passeava todo faceiro por entre tantos túmulos suntuosos e outros nem tanto. Fiquei admirado de vê-lo sorridente, e de cabeça erguida, passar e cumprimentar, sem nenhum acanhamento, pessoas que, outrora, ele temia até mesmo dirigir-se a elas. Estavam todos ali, numa verdadeira galeria de ex tudo: políticos, bacharéis, militares com as suas fardas; mas também o seu Zezinho da mercearia, aquele pipoqueiro de todos os eventos e dos domingos de missa. Era uma verdadeira procissão dos que já se foram e que, de igual maneira ali foram parar. “Plebeus e reis, fariseus e gays, índios, amarelos, brancos, negros, moicanos, pardos, mulatos, mestiços, malucos, mendigos, palhaços, guerreiros de todas as tribos...” Recordei as lutas do meu pai e as suas conquistas, as decepções e perseguições pelas quais ele passou, até se cumprir a sua missão por aqui. E percebi então que ele estava em paz. Fiz uma oração bem simples pra ele e saí dali aliviado. Corri e fui contar o ocorrido para a minha mãe, que quase já não consegue mais absorver o que se diz pra ela. O tempo parece ser mesmo um moto-contínuo. (Eliel Silva – 26 de fevereiro de 2016)